Sábado, Setembro 28, 2024
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Será que o Eu que há em mim vale mais do que todos os outros?

A noção de bem comum que habita em mim é diferente da certeza da necessidade do amor próprio. A busca tresloucada pela elevação da autoestima tem causado frustração, angústia, depressão e males antes tidos como “frescura de rico” como depressão, transtornos narcísicos, histrionismo, perturbações mentais, pulsões suicidas, dentre outros. Psicólogos, psiquiatras e psicanalistas nunca foram tão necessários quanto agora. Até eles mesmos estão saindo do seu eixo de equilíbrio mental. 

Cada vez mais, se busca no outro, ou fora de si, explicações, soluções, saídas, parâmetros para suas satisfações e gozos ao invés de se buscar em si mesmos. Com isso, destruímos nossa noção de identidade antes mesmo de tê-la como uma possibilidade. Somos levados a consumir sonhos e desejos antes mesmo de aprendermos a articular a fala, o andar, o mastigar e engolir. Não nos damos mais tempo para sentir falta de um abraço, de um lugar seguro, ou mesmo da insegurança. A dor física é quase algo ultrapassado. Apenas dilaceramos nossa psiquê e não temos estrutura para suportar os golpes. Talvez seja por isso que vivemos uma geração tão preocupada com a forma corporal e tão vulnerável psicologicamente. 

O abismo, ou os hiatos, entre o desejar demasiado e o viver o real em escassez têm atropelado qualquer possibilidade de conviver em grupo, e portanto, saber o que é bom ou não para se ter o tão falado bem-estar social. A célula agora é o Eu, o objetivo é ser invejado, copiado e criticado e não mais compartilhar. A disputa é o único valor construído e a competição exacerbada é a única lógica praticada. 

Há, portanto, que se questionar se realmente estamos evoluindo. Será que o homem da idade média era mais generoso com os aldeões de sua vila do que seu vizinho é com você e vice-versa? Será que a fé professada no século XV era tão agressiva e devastadoramente excludente quanto é professada hoje em dia? Será que o soldado do rei era tão fiel ao seu comandante quanto é hoje? Será que a proporção de famintos nos campos do século XVIII com o que se produzia para comer era tão discrepante quanto agora? Perguntas que nos intrigam por sabermos as respostas. E pior, por gostarmos delas. Podemos ter produzido tanta tecnologia e avançado tanto na ciência que perderemos em breve o controle sobre a inteligência artificial, se é que já não perdemos. Mas a obsessão de controlar o incontrolável, viver o improvável, e ter impossível, nos trará ao auto-extermínio sem ao menos nos dar conta disso. Viva o Psicólogo! Viva o Psiquiatra!

Viva o Psicanalista! Afinal, não há cérebro que aguente tanta pressão.

Por Mardonio Gomes